No extremo nascente da "Casa da Fonte", em Rio Mau, Vila do Conde, onde a minha mãe nasceu e de onde herdou um campo que ainda cultivo, passa um caminho, entre campos e bouças, conhecido como "caminho do Porto". Nesse caminho, desde tempos medievais, passavam os viajantes e peregrinos que, vindo do Porto, haviam passado pelo convento de Vairão e pelas pontes romanas do Rio Ave e do Rio Este a caminho do Mosteiro de S. Pedro de Rates em direção a S. Tiago de Compostela.
Na minha infância, nas visitas à Casa da Fonte ou nas vindimas nas ramadas do Campo da Bouça, não me recordo de alguma vez ter visto passar peregrinos a caminho de S. Tiago, mas fascinava-me e intrigava-me a ideia de ser possível ir tão longe por caminhos daqueles.
Da adolescência recordo-me de ir com os meus pais a Compostela e ter a sorte de ver em ação o “botafumeiro”, o turíbulo gigante da catedral que espalha o incenso em toda a catedral (se nunca viram, há muitos vídeos no Youtube).
Da juventude recordo-me de acompanhar o renascer do caminho de S. Tiago nos seis anos que passei na Escola Agrícola de S. Pedro de Rates ao lado da velha igreja romana, entre 1989 e 1995.
Voltei a rever os peregrinos de Compostela após 2004 quando comecei a cultivar alguns terrenos que aluguei terrenos junto à “Estrada velha”, entre Árvore e Azurara, que vêm do Porto pelo “caminho da Costa”, aproveitando os belos passadiços do litoral de Vila do Conde. Vejo-os a passar e eles vêem-me a trabalhar os campos. Que pensarão de mim? Às vezes caminham sós, outras vezes casais ou pequenos grupos, muitas vezes gente com alguma idade mas com uma juventude na alma que procura uma experiência diferente. Tenho admiração por eles e uma pontinha de inveja, boa. Impressionou-me e comoveu-me um peregrino/a em cadeira de rodas apoiado por outro/a.
Custou-me ver desaparecer todo esse movimento devido ao Covid e tive um gosto imenso por ver regressar os peregrinos à estrada nas últimas semanas antes e depois da Páscoa, da mesma forma que tenho gosto em ver as publicações dos amigos que caminham até Compostela.
Faço parte do grupo de pessoas que gostavam de fazer o “caminho” mas por múltiplas razões ainda não o fez e poderá fazer ou não um dia.
Há dias, na véspera do nosso aniversário de casamento, de um fim de semana alargado e aproveitando a pausa forçada nas sementeiras por causa da chuva, também fomos a S. Tiago de Compostela. Não podendo ir a pé, fomos de carro. Parámos em Ponte de Lima para merendar, fomos até ao “Monte do Gozo”, próximo de S. Tiago, assim chamado por ser o ponto, no caminho francês, onde se avista pela primeira vez as torres da Catedral de Compostela, o que é motivo de gozo (satisfação) para os peregrinos. Pernoitamos em Compostela e no feriado do 25 de Abril visitámos calmamente a catedral, o seu museu, as praças circundantes e assistimos à chegada de muitos peregrinos portugueses, a pé e de bicicleta.
Com esta publicação quero desejar “bom caminho” aos que caminham para Compostela, para Fátima ou para qualquer outro ponto de peregrinação de qualquer religião, aos que caminham para casa de um amigo, que dão os seus pequenos passos na rua ou no jardim da casa ou mesmo aos que já não podem ou nunca puderam caminhar fisicamente, mas caminham espiritualmente connosco na vida. Partilho convosco algumas imagens desta etapa do nosso “caminho”, na esperança que seja um momento de descanso, conforto e ânimo no vosso caminhar. Bom caminho!