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As guerras do trigo e a guerra da proteína

por Carlos Neves, em 12.02.23

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No livro “As Guerras do Trigo” (Edições Zigurate, 2022), o autor Scott Reynolds Nelson percorre os últimos 12 000 anos da humanidade para explicar como o controlo e organização da produção, armazenamento e distribuição do trigo para o fabrico do pão condicionou a história dos  impérios e das guerras que os formaram e destruíram. A narrativa deste livro começa precisamente em Odessa, o porto Ucraniano cujo bloqueio na atual guerra aumentou o preço dos cereais e colocou em risco a alimentação de muitos países, em particular dos mais pobres, até que um acordo mediado pela ONU e pela Turquia permitiu retomar a exportação.

Não é meu objetivo fazer um resumo das 382 páginas do livro, mas apenas partilhar um aspeto que me chamou a atenção na página 158, num capítulo relativo ao período entre 1864 e 1884, quando a Europa abriu as suas portas ao trigo americano para combater a terrível fome causada pelo míldio da batata. Na Bélgica, Antuérpia tornou-se um dos principais portos de entrada e processamento do trigo. O farelo e a sêmea que sobravam da moagem foram usados para alimentar porcos e vacas. “Os agricultores de Antuérpia e das regiões que se estendiam pelo Reno e pelos seus afluentes trocaram os arados por pocilgas, os campos por pastagens e as plantas por animais (…) os trabalhadores europeus começaram a consumir alimentos a que apenas os mais abastados tinham tido acesso até então, como manteiga, bacon, queijo e chocolate”.

Reparei neste pormenor porque, para além da guerra do trigo na Ucrânia, temos atualmente no mundo ocidental uma guerra à proteína animal presente na carne, leite, ovos e até peixe, tendo as rações como pilar fundamental da criação. Uma das armas mais usadas nesta guerra é a acusação de que a produção de alimentos para a pecuária ocupa a maior parte das terras agrícolas no mundo bem como os novos terrenos que resultam da desmatação de florestas. Na realidade, para além de muitas das terras usadas para pastagem não terem capacidade agrícola, muitos dos cereais e proteaginosas são primeiramente destinadas à alimentação humana (óleo de soja, por exemplo) ou à produção de energia (biocombustíveis) e só os restos, os subprodutos, são incorporados nas rações: bagaços de soja, de colza, a polpa de beterraba, a polpa de citrinos, destilados de milho, etc, etc. Os animais, em particular os ruminantes, são "recicladores" de sobras que iriam para o lixo se não fossem desta forma aproveitados. Isto acontece naturalmente nas casas agrícolas onde o porco ou outros animais domésticos comem os restos do almoço e acontece no setor pecuário de forma organizada através das fábricas de rações. 

 

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publicado às 20:02



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