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Bem-vindos e obrigado! (sobre um reboque em marcha-atrás)

por Carlos Neves, em 27.10.24

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Na freguesia onde vivo, Árvore, existem seis casas agrícolas, seis “casas de lavoura” com famílias que se dedicam à produção de leite. Por coincidência, metade estão reunidas à volta do pequeno e antigo largo de Lente, na curva mais apertada da Nacional 104, que liga Vila do Conde a Santo Tirso. Nas suas eiras de granito ocorreram, ao longo de séculos, as desfolhadas coletivas do milho, tal como relatadas nos livros de Júlio Dinis, milho que depois era guardado no espigueiro e servia de alimento a pessoas e animais. Há 50 anos, com o crescimento da produção de leite, passámos do aproveitamento do milho grão para a silagem que utiliza toda a planta do milho, porque, ao contrário de nós e dos outros monogástricos, as vacas conseguem digerir a fibra. A silagem era feita com pequenos tratores e máquinas de ensilar, de forma individual, cada família por si . Mais recentemente, nos últimos 20 anos, essas pequenas máquinas foram substituídas por grandes automotrizes que colhem 6 ou 8 linhas de milho e precisam de vários tratores e reboques para transportar a silagem para o silo. Há quem pague esse serviço e quem faça equipas entreajuda com amigos, vizinhos e familiares, usando o seu trator e reboque.
Há mais de 60 anos, a minha tia Ana, irmã de minha mãe, deixou a casa materna junto à fonte, em Rio Mau, e pelo casamento veio morar para uma destas casas de lavoura aqui no lugar de Lente. Há 15 dias, por algumas horas, eu deixei a minha casa na fronteira dos lugares do Souto, Pindelo e Quintã, que o povo chamava de “Quintão”, e subi até ao lugar de Lente para “ajudar quem me ajudou”, neste caso os meus primos que, como eu, continuam o legado da família na agricultura e produção de leite. No mesmo dia, no sentido oposto mas com o mesmo objetivo, o Carlos Antunes desceu da freguesia de Vairão, para ajudar na silagem do seu tio, vizinho dos meus primos. Numa das viagens entre o silo e o campo, tive de parar na estrada, enquanto o Antunes manobrava o trator e reboque, em marcha-atrás, para começar a cortar o milho num dos campos. Aproveitei a paragem para puxar do telemóvel de modo a filmar e depois mostrar uma manobra bem feita, mas normal nas nossas silagens. Partilhei o vídeo na minha página de facebook alguns dias depois, quando já andava noutra equipa a colher outra silagem, desta vez em Mindelo, entre campos, bouças, casas, estradas e linha do metro, no “mosaico” típico aqui de Entre Douro e Minho.
O vídeo tornou-se viral, teve milhares de “gostos”, mereceu elogios, partilhas e impressionou agricultores de todo o mundo, nomeadamente do Norte da Europa, uns admirados com a destreza da manobra, outros a teimar que devia “entrar de frente”. Pela amostra dos comentários, fiquei com a impressão que somos bons a conduzir, inventar e desenrascar, face aos nossos colegas europeus que resistem mais à mudança.
Foi a minha publicação mais vista de sempre. Milhares de “gostos” e centenas de comentários e partilhas. Em duas semanas, a minha página passou a barreira dos 20.000 seguidores e o alcance das minhas publicações passou de 400.000 para mais 3 milhões de pessoas. A todos os que agora aqui chegaram, bem-vindos!
A quem me acompanha há vários anos, comentando e colocando “gostos”, muito obrigado! Para esses, uma nota final: o campo que aparece no filme é nesta imagem é o campo de uma história que já contei aqui:
No livro "memórias de um lápis de lousa", o autor, Fernando Pinheiro lamentava que o velho tanque de lavar (no canto esquerdo inferior da imagem), por onde passava no caminho para a escola, o tanque para regar o campo onde ia com os colegas de infância fazer xixi na toca dos grilos na primavera, esteja agora abandonado e a ramada tenha desaparecido. Respondi que o tanque está abandonado por um bom motivo: todas as pessoas agora têm água canalizada e máquina de lavar. É verdade que as ramadas foram quase todas cortadas, porque esta terra, muito próxima do mar, tem poucas condições para produzir vinho de qualidade, mas não falta bom vinho português, de melhor qualidade que antigamente. E o terreno continua a ser regado, agora com motor direto do poço e continua cultivado pelos descendentes ou caseiros, tal como todos os terrenos das antigas casas de lavoura do lugar de Lente e de toda a freguesia de S. Salvador de Árvore.
#carlosnevesagricultor #milho #silagem #entreajuda

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publicado às 07:14

Vantagens, custos e truques de "andar cedo"

por Carlos Neves, em 22.10.24

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Viram as imagens e vídeos que publiquei nos últimos dias, na minha página de Facebook, com milho caído, tratores enterrados na lama e milho cortado à mão e metido “à posta” para a máquina de ensilar? Pronto. Agora já sabem de onde veio a minha “mania” de semear e colher o milho na data mais cedo possível.
Há uns 40 anos, mais coisa menos coisa, andei eu assim a ajudar a família. Tenho bem vivas as memórias, dos anos 80, de milho caída na “Bouça Aberta”, um campo junto às bouças (“bouças” é como chamamos às parcelas de floresta aqui no Norte, ok?), de pedir o Fiat 640 do Tio Carlos Penas para rebocar o nosso Massey Ferguson 265 no Campo da Ribeira do Loureiro enquanto ensilava o milho, de passar dias a cortar, arrastar e meter o milho à mão na máquina, na “Arroteia de Baixo” e, já no ano 2000, no primeiro ano que veio a máquina grande cortar o milho (a automotriz), no dia 5 de outubro, ter de parar a máquina um bocadinho antes de enterrar e deixar uns 2000 m2 para depois desfolhar à mão, com galochas, no meio da água. E ainda as memórias de agricultores vizinhos que perderam braços e pernas com as máquinas de ensilar por causa do milho caído. É para fugir a tudo isso que “ando cedo”.
“Andar cedo” tem ainda outras vantagens: fugir aos ataques da bicharada (insetos do solo) que costumam ser mais intensos nas sementeiras tardias, por causa das temperatura mais altas, aproveitar as chuvas tardias da primavera (que este ano se estenderam até julho) para poupar nas regas e “apanhar” a máquina de ensilar mais disponível, com as facas novas e os condutores com a cabeça ainda fresca. E ter a comida dos animais disponível mais cedo.
Porque cada moeda tem cara e coroa, também há desvantagens, por exemplo: já me aconteceu ter a terra pronta para semear e não ter ainda adubo ou sementes disponíveis; tenho de colher a erva da produção de outono - inverno mais cedo e com menos produção do que se esperasse pelo fim de abril ou maio para cortar; há algum risco de vir chuva ou uma cheia tardia e ter de repetir a sementeira (mas ainda não aconteceu); e porque "o primeiro milho é dos pardais", ter que usar repelente para evitar o desbaste que as pegas fazem em algumas sementeiras de milho.
Alguns “truques” possíveis para conseguir “andar mais cedo” com as colheitas e sementeiras” (haverá outros, certamente):
- Na sementeira da erva no outono, escolher espécies e variedades e misturas mais precoces;
- Aproveitar os primeiros dias de bom tempo no fim de março ou início de abril;
- Começar pelos campos mais enxutos e deixar os “lameiros” para depois;
- Na sementeira do milho, nos “lameiros”, andar cedo nas partes de cada campo onde é possível e deixar os bocados mais encharcados para semear mais tarde com um ciclo muito curto;
- Usar variedades de milho com ciclos mais curtos;
- Deixar a limpeza das bermas dos campos (as “beiradas”) para depois de cortar o milho;
- Fazer a adubação do milho no semeador (à linha) e depois na cobertura;
- Fazer a “monda química” depois do milho nascer;
- Na altura das colheitas e sementeiras, trabalhar de madrugada, de dia, ao serão, ao domingos e feriados (depois descansa-se);
- Recorrer aos prestadores de serviços para fazer mais rápida a lavoura ou sementeira;
- Observar o que fazem os vizinhos, pedir conselhos aos técnicos, experimentar e “esticar” a corda cada ano um bocadinho mais cedo.
- Adiantar o que é possível, encomendas, revisões, lubrificações.
- Não ficar com a ideia: “Ah, vocês aí à beira mar tem campos com areia e andam todos cedo”. Não. Aqui entreos meus vizinhos também há quem ande cedo, a meio e tarde. Aliás, recorrendo aos prestadores de serviços, não podemos andar todos ao mesmo tempo. “Quem não tem carros nem bois, é antes ou depois”. E cada ainda é livre de semear quando quer na sua casa e na sua terra.
Espero ter-vos ajudado e não enervado mais, como diz um amigo quando publico as fotos das primeiras colheitas ou sementeiras: “Já andas a enervar o pessoal!”. Não é de propósito! Bom trabalho!
#carlosnevesagricultor #agricultura #feno #milho #sementeiras #colheita

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publicado às 14:16

Troco livros por feno para ajuda aos afetados pelos incêndios

por Carlos Neves, em 19.10.24
 

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Feno. Erva que era verde e foi cortada e seca ao sol para alimentar os animais ao longo do ano. Atrás de mim está o feno que fizémos na primavera para os nossos vitelos. Infelizmente, os incêndios de Setembro passado queimaram muitas pastagens e muito feno que os agricultores tinham guardado para alimentar os animais até à próxima primavera. Por isso, de vários pontos do país e através de várias associações, já seguiram alguns camiões de feno oferecidos de agricultores para agricultores. Pequenas ajudas para as necessidades imediatas e também um sinal de estímulo e solidariedade, para que não se sintam tão sós e desanimados depois do inferno que passaram. Eu já dei um pequeno contributo e agora estou a colaborar para encher mais um camião, desta vez com fardos de feno pequenos como estes, mais fáceis de distribuir pelos criadores da região de Castro Daire que não têm máquinas para descarregar rolos de feno de grandes dimensões. Eu tenho pouco feno disponível para oferecer, mas ainda tenho bastantes livros de crónicas agrícolas para vender. A impressão já foi paga e portanto posso oferecer o valor dos livros que vender na próxima semana e comprar feno para oferecer. Por cada livro de crónicas agrícolas que vender por 13,5€, descontando o envio em correio registado, ficam 10 euros para ajudar. Os interessados enviem mensagem por aqui ou por mail (carlosneves74@sapo.pt) para eu indicar o NIB ou MBWay para o pagamento e me enviarem a morada. Ficam com um livro para ler ou para oferecer no próximo Natal, que está quase à porta. Como sabem, "dos Santos ao Natal é um salto de pardal".
Ah, e o trator, que faz aqui? Bem, as minhas publicações sobre tratores costumam ter mais sucesso do que as publicações sobre livros😅, portanto pode ser que ajude a dar visibilidade a esta causa... Fiquem bem!
#carlosnevesagricultor #desconfinaraagricultura
#cronicasagricolas
#feno
#incendios

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publicado às 23:22

O bom, o mau e o vilão na produção de milho grão

por Carlos Neves, em 12.10.24

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Bom: o milho é uma cultura fantástica com grande capacidade de fotossíntese. Na espiga está 60% do valor da planta. O grão é muito energético. Um hectare de milho a crescer liberta mais oxigénio do que uma floresta.
Bom: choveu na primavera e início do verão, pelo que tivemos mais água nos poços para regar, menos necessidade de rega e melhores produções nos campos secos onde falta a água ou o tempo para regar.
Mau: a chuva atrasou as sementeiras e o tempo fresco ao longo do verão atrasou ainda mais a colheita.
Bom: apesar de tudo, consegui semear os campos destinados à produção de milho grão a 15 de abril, escapar aos ataques da bicharada que costumam vir mais tarde e aproveitar as chuvas da primavera e verão.
Mau: muita gente não conseguiu semear tão cedo e quando quis começar a colher o milho disseram-me que não havia milho suficiente para abrir o secador, surgiu ainda uma avaria e a primeira chuva apareceu no horizonte.
Bom: consegui novas parcelas para cultivar e aumentei a área de “milho para as galinhas”, de ciclo muito curto, que não precisava de ir ao secador.
Mau: o portão de entrada de um desses campos só tinha 3 metros de largura e não era suficiente para as debulhadeiras que colhem 4 ou 6 linhas.
Bom: Havia uma debulhadeira pequena disponível (Laverda M100).
Mau: Estava avariada;
Bom: Era possível alargar a entrada com uma obra simples, mas, entretanto, a máquina ficou pronta para trabalhar e marcámos para meio da tarde de um sábado.
Mau: a máquina avariou no campo do cliente anterior.
Bom: Foi reparada e chegou às 20h00 a minha casa.
Mau: Avariou novamente a 100 metros do meu campo.
Bom: o mecânico era boa pessoa, veio ajudar, às 21h30 começamos e às 23h30 acabámos.
Mau: o secador continuava fechado para entregar o outro milho das maiores parcelas; No dia que abriu (segunda-feira, 30 de setembro), quem me vinha debulhar o milho com uma Laverda 3400 de 4 linhas, estava comprometido para fazer uma silagem do milho e depois terça e quarta choveu; Também tive de cancelar os camiões de transporte para o secador porque o reboque graneleiro que tinha contratado para levar o milho da maquina ao camião também avariou antes de chegar.
Bom: na quinta-feira a chuva passou e depois do almoço começámos a debulhar. Fizemos uma parcela grande e começámos outra. Levei o milho ao secador com o meu reboque (uma hora de viagem) e com um reboque emprestado.
Mau: às 20h00, partiu um carreto importante com previsão de avaria demorada. Tive de devolver o reboque emprestado porque ia para a silagem no dia seguinte. A máquina velhinha estava com avaria.
Bom: Na sexta de manhã o Daniel conseguiu trocar o motor de arranque à velhinha e veio continuar o trabalho depois do almoço, primeiro uma pequena parcela, depois acabámos o que faltava na outra; Consegui outro reboque emprestado para levar milho. Levei o Daniel a casa depois do jantar e faltavam pouco minutos para a meia-noite quando passei em Vairão a combinar com o motorista e com o pessoal da debulhadora Claas de 6 linhas, que andou noite fora; no dia seguinte fui “buscar” a máquina como “carro piloto” e colhemos debaixo de muita humidade a parcela maior que me faltava (cerca de 3 hectares). Consegui colher todo o milho que semeei, sem cair, antes do temporal. O reboque graneleiro de trasfega ficou pronto 15 dias antes do previsto e também ajudou um pouco.
Mau: Tentei colher o milho de um familiar mas estava mais verde que o meu e não foi possível.
Bom: Devolvi os reboques emprestados sem os avariar.
Muito bom: a disponibilidade dos motoristas, do pessoal do secador e de quem me emprestou reboques!
E o Vilão? Há dois: Primeiro, o baixo preço do milho, que dificilmente paga todo este trabalho e depois o outro vilão tem sido o estado do tempo, neste outono molhado com o maior temporal dos últimos anos que nos atrasou o trabalho e deitou muito milho ao chão. Espero que, entretanto, venha um BOM Verão de S. Martinho. A agricultura é a arte da esperança.

 

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