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A foto da alegria do Lourenço, em cadeira de rodas, a ser levantado pelos amigos para ver o Papa Francisco na Jornada Mundial da Juventude tornou-se viral e fica na memória desta JMJ. Vemos um jovem feliz porque os outros jovens à sua volta, seguindo o lema “Maria levantou-se apressadamente e partiu” (para cuidar de Isabel), também se levantaram, não para registar o papa no seu telemóvel, mas para erguer Lourenço. Um exemplo de alegria de viver, da alegria de servir, daquilo que nós devíamos ser e gostávamos de ser todos os dias.
Eu cresci no seio de uma família religiosa, mas durante a infância, para além da catequese a minha fé era vivida através da reza diária do terço em família depois do jantar, “botado” pela avó Esperança, e pela ida à missa de domingo, na igreja matriz de Vila do Conde ou na “Igreja do Barco” (Senhor dos Navegantes) nas Caxinas. Antigamente, muito lá para trás, os lavradores iam à primeira missa da manhã na sua paróquia. Porém, nas últimas décadas, aqui na zona, com a produção de leite, surgiu a rotina de levantar, fazer a ordenha, “arrumam o gado” e só depois tomar o pequeno-almoço e ao fim da manhã ir à missa. Além dessa dificuldade, havia outra que levava a minha família a ir a missas fora da paróquia. O padre, já idoso, tinha mau relacionamento com a minha família porque tinha medo de que o meu tio Padre Carlos, missionário comboniano em África, voltasse para padre diocesano e lhe tirasse o lugar, não o deixava celebrar missa aqui na terra quando vinha de férias e terá dito que só o deixaria fazer o funeral da minha avó. Depois vieram outros padres e a igreja tornou-se mais acolhedora.
Nos anos em que estava em Portugal, o “Tio padre” passava as férias de verão em nossa casa, o que me permitia fazer férias na praia “a sério” ao acompanhá-lo e também me ajudou a crescer na fé. Uma vez, estávamos no terraço, perguntei ao meu tio quantas ordens religiosas e movimentos existiam na igreja. Com um sorriso nos lábios e um apurado sentido de humor, respondeu-me “Olha, Carlos, são tantos que se diz que nem Deus sabe…”
Quando fiz 15 anos, num fim de semana de outono, o meu pai levou-me a um curso de animadores de jovens de um desses movimentos, a Acção Católica Rural (ACR). Tanto o meu pai como a minha mãe tinham feito parte da Juventude Agrária Católica nas freguesias de origem até se casarem.
Passados alguns meses após o curso, comecei um grupo de jovens na paróquia e integrei depois a Equipa Diocesana da ACR e a Equipa Nacional. Nunca fui a uma jornada mundial da juventude, mas durante cerca de 15 anos, em equipa, organizei acampamentos, Campos de férias, viagens, por exemplo à Expo98, convívios e momentos de oração e formação. A formação podia ser pontual ou organizada em encontros mensais na Escola Diocesana de Animadores da ACR, dinamizada pela Glória Costa, da qual recordo uma frase: “Sem um grupo és um órfão!”
Com o passar dos anos reduzi a minha participação ativa na ACR e envolvi-me em diversas associações agrícolas, para onde levei muito do que aprendi na ACR. Em grupo, tomámos posições, fizemos manifestações, organizamos viagens e momentos de formação.
Voltando às jornadas da juventude, todos os momentos extraordinários que vivemos e assistimos só foram possíveis com o trabalho de preparação e execução de milhares de grupos, nos países de origem dos peregrinos e em todas as dioceses de Portugal incluindo o grupo de amigos que levou o Lourenço e o levantou do chão para ver o papa. Sozinho, nenhum dos amigos o conseguiria levantar. São membros de um GRUPO, curiosamente chamado “Tudo à pressa” que organiza atividades e campos de férias.
A propósito da JMJ, da igreja e da religião, há muita gente que se afirma crente em Deus, mas vive a sua fé em privado e individualmente. É uma decisão livre que devo respeitar sem qualquer tipo de censura ou “olhar de cima”, mas tenho a obrigação de explicar, pelo meu testemunho, que em grupo organizado vamos mais longe, fazemos mais coisas e sentimo-nos mais apoiados. Na Igreja, no caminho de Fátima ou Santigado de Compostela, na atividade agrícola e na vida em geral, os grupos informais, associações, cooperativas exigem de nós um esforço de participação, um contributo com as nossas capacidades e a aceitação das opiniões dos outros, mas permitem-nos fazer mais, dar mais e receber mais. “Sozinhos vamos mais rápido, juntos vamos mais longe”.
Na Igreja há lugar para todos e há muitas opções diferentes, muitos grupos diferentes entre as ordens religiosas e movimentos de leigos que “são tantos que nem Deus sabe”. Há muitas opções para quem se quiser integrar. Em grupo a fé cresce mais. Em grupo temos oportunidade imediata de colocar em prática o “amor ao próximo”, o perdão e a ajuda. Há coisas que só alcançamos em grupo.
Escrito para o Mundo Rural de Setembro / Outubro de 2023
Durante a infância e juventude, o dia de aniversário da minha esposa coincidiu muitas vezes com os longos dias de silagem em que era preciso ajudar a família a espalhar a silagem de milho no silo de forma manual, com ganchos e forquilhas. Na minha casa era igual. Poucos anos antes de casarmos comecei a recorrer ao serviço de automotriz para cortar milho, o trabalho de espalhar ou "abrir" o silo passou a ser feito com trator, mas desde então surgiu a nova tarefa de preparar o almoço para a equipa que nos vem ajudar. Antes eram semanas de trabalho, agora é apenas um dia ou dois, mas por causa do clima, de avarias que atrasam, da maturação do milho ou da agenda apertada dos prestadores de serviços alguns dias de aniversário continuaram condicionados pela silagem. Este ano o aniversário coincidiu com um fim de semana e porque já tínhamos o silo fechado e os miúdos ainda não tinham aulas, aproveitámos para finalmente visitar a barragem do Alqueva, o maior lago artificial da Europa, passando no paredão e passeando de barco desde a praia fluvial de Monsaraz até à ilha dourada. Pelo caminho visitamos uma família amiga, e na cidade de Évora visitámos o Templo de Diana, Praça do Giraldo, Capela dos Ossos, a Igreja de S. Francisco, a colecção de presépios que alberga e subimos a torre da Sé Catedral. Passámos ainda no fluviário de Mora.
Partilho estas coisas porque são bonitas, porque merecem a vossa visita e partilho também para "desafiar" muitos colegas agricultores que têm limitações como nós e trabalham ainda mais do que nós, para se decidirem também a sair e descansar um pouco com a família. É possível, é muito importante, há muita coisa bonita para ver, o trabalho fica um pouco atrasado mas sabe melhor e rende mais quando voltamos.
#carlosnevesagricultor
Esteve aqui uma representação do futuro da produção de leite.
Daqui a dois anos, estas vitelas serão vacas adultas a produzir leite.
Daqui a vinte anos, muitos destes miúdos estarão a assumir o futuro das quintas, vacarias, casas agrícolas ou "casas de lavoura". São o nosso pequeno tesouro.
99% das empresas agrícolas dedicadas à produção de leite são detidas por famílias.Em 99,9% dos casos, é uma atividade passada entre gerações.
É muito difícil alguém vir de fora para o setor por causa dos custos do investimento inicial, do tempo necessário para o retorno desse investimento e porque a "capacidade de sacrifício", de aceitar o cheiro das vacas, os horários e imprevistos se aprendem mais facilmente desde o berço.
Antes de chegarem a esta exibição, os "jovens manejadores" passaram semanas a lavar, preparar e treinar as suas vitelas. Um bom "treino" que os prepara para o futuro que os espera neste setor.
Portugal tem a mais baixa taxa de jovens agricultores da Europa. Todos os anos 200 produtores abandonam o setor sem ter sucessores. Temos de pagar justo pelo leite e cuidar bem dos poucos que querem continuar.
PS - Parabéns ao José Pedro Marinho Teixeira (de Amarante) que venceu o prémio de melhor manejador neste primeiro grupo dos mais novos. O Luís e a Estrelita portaram-se muito bem e ficaram em segundo lugar, tal com todos os outros meninos e vitelas. Correu tudo bem e ninguém se magoou, que é o mais importante.