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Dediquei os últimos anos da minha vida a tentar evitar que a sociedade tenha raiva dos agricultores. Antes disso, tentava evitar que tivessem pena dos agricultores. Isso passava, entre outros aspetos, por termos férias como as “pessoas normais”.
Na minha infância e juventude, à semelhança de muitos colegas agricultores da minha geração, nunca tive oportunidade de passar férias com os meus pais. As viagens mais longas eram a Braga, Fátima ou Santarém, a sair depois da ordenha da manhã e voltar antes da ordenha da noite. Só a partir dos 18 anos comecei a tirar uma semana de férias, para participar em acampamentos e “campos de férias”.
O meu pai só começou a poder viajar, em viagens organizadas pelos cursos de empresários agrícolas ou pela paróquia, quando eu, já adolescente, era capaz de tomar conta das vacas com a minha mãe. A minha mãe acompanhou-o mais tarde quando eu já adulto pude ficar sozinho / com ajuda a tratar da vacaria.
Fazer uma semana de férias em família, com a esposa e os miúdos, mesmo que seja quase sempre uma “semana” de 6 dias, tornou - se quase sagrado para mim. Interrompemos o ano passado por causa do Covid e outras dificuldades, mas voltamos à estrada este ano. Temos a “ajuda” do robô de ordenha e de outra mecanização. Continua a exigir um esforço de preparação. A dedicação do Hugo, nosso funcionário e a pontual colaboração de outras pessoas foi sempre fundamental. Procuro simplificar ao máximo o trabalho a fazer. Os programas de computador e a internet permitem ajudar a gerir à distância.
Apesar de tudo, há sempre custos laterais. Deixar uma equipa em serviços mínimos não é a mesma coisa que estarmos todos no ATIVO.
Escolhemos um local diferente do nosso destino dos últimos anos, suficientemente perto para voltar a casa se fosse preciso resolver algo importante ou tomar a vacina. Trocámos o Algarve pelo Alto Minho e o Hotel por uma casa de férias em Vilarelho, Caminha. Foi bom passar estes dias entre as praias de Vilar de Mouros, Caminha e Moledo, entre Monte de Santa Tecla (do lado de lá) e os miradouros de Santo Antão e da Fraga, do lado de cá, com vista para a mata nacional do Camarido, excelente para caminhadas. Pequenos tesouros naturais que pudemos desfrutar enquanto fazíamos uma pausa na vida do costume. Se vos conto estes detalhes, não é para me "armar", mas tão só para vos provocar, para fazer uma inveja “boa”, para vos desafiar também a fazer uma pausa. Mais longe ou mais perto, mais longo ou mais curto, nem que sejam uma ou duas semanas a ir à praia mais próxima, façam uma pausa e aproveitem 3 vezes as férias: 1) Começa - se a desfrutar sonhando com as férias, 2) vive-se as férias, 3) desfruta-se depois as recordações...
#carlosnevesagricultor
O meu conterrâneo Fernando Soares publicou uma foto de um dos meus campos de milho, ao entardecer. Perante alguns elogios à paisagem entre os comentários à foto, lembrei-me que uma parte daquele terreno esteve abandonada, cheia de silvas e a acumular o lixo deixado pelas cheias , até há poucos anos. E lembrei-me de uma anedota que o meu pai gostava de contar, com o diálogo entre um padre da aldeia e um lavrador:
- Ó ti Manel, você e Deus nosso Senhor têm aí um belo quintal!
- É verdade, Sr. Abade, mas havia de ver como estava isto quando era só o meu sócio a tratar do terreno!😊
(Se a anedota fosse inventada hoje, teria Deus no Céu, o agricultor na terra e a PAC em Bruxelas 😅)
Nesse campo cresce agora o milho, já sachado, à espera do calor que o ajude a crescer. Olho para ele todos os dias e passo perto sempre que possível. Um amigo alentejano ensinou-me que “o olho do dono engorda o boi” e eu acho que também faz bem ao milho ou à erva. Por isso tenho outras fotos deste campo, algumas tiradas por mim no mesmo local, durante o inverno, quando lá cresce a erva que semeámos no outono, depois de colher o milho. A esta sucessão de culturas chamamos rotação.
As rotações são importantes porque cada planta tem necessidades diferentes e a erva cresce no outono e início do inverno com os nutrientes que o milho não aproveitou. E o milho aproveita depois os nutrientes que as ervas como as leguminosas (trevos, ervilhacas) deixam no terreno através das raízes, do restolho, ou de toda a cultura que pode ser enterrada, se for semeada com esse objetivo de “adubação verde” ou sideração.
O nosso clima ameno permite esta sucessão de culturas que mantém o solo ocupado. Mais a norte, a neve e o inverno frio não permitem a mesma produção de milho no verão nem de erva no inverno.
Entretanto, ouvi dizer que pelos corredores de Bruxelas, no âmbito da próxima PAC, se voltou a falar em “rotação” obrigatória de culturas para se receberem aquelas ajudas que nos ajudam a manter os campos cultivados, recebendo menos do que era preciso pelo que produzimos para alimentar a sociedade. Já se discutiu isso na última PAC no âmbito do “Greening” e nessa altura estivemos debaixo da ameaça de só poder cultivar milho em 75% da terra. Por cada 10 hectares de terra só poderia semear 7,5 hectares de milho. Isso seria mais uma desgraça para os produtores de leite e para a pecuária em geral, porque somos um país deficitário em milho que só produz 25% das necessidades e o milho está com preços altíssimos no mercado internacional. Temos as máquinas para cultivar milho, temos os melhores terrenos, o melhor clima e um mercado super deficitário.
Em 2013 o problema resolveu-se com a certificação da cultura de ontono-inverno, com evidentes vantagens de manter a terra coberta e cultivada no inverno, mesmo por parte de quem não tinha vacas e não pensava vender erva. Para bem da biodiversidade e sem afundar a economia agrícola, há regras mais razoáveis que se podem implementar, como as sebes vegetais, as árvores nas bordaduras e as margens para promover a polinização. Espero que o bom senso volte a prevalecer para manter o ambiente sem desmantelar a agricultura.
#carlosnevesagricultor
Ninguém rega certinho como S. Pedro. A chuva macia que ontem caiu ao longo do dia estragou os planos para um picnic da turma do meu filho mais novo, mas “valeu ouro” para o milho, disse eu ao mais velho. “Mas nós não pagamos a água dos poços com que regamos!”, respondeu-me. Pois não, mas pagamos a eletricidade… E há campos onde não tenho água de rega ou não temos tempo de ir lá regar. Por isso estas orvalhadas de S. João, temperadas, sem estragar, estão a ser preciosas…
Antigamente os meus pais e avós levavam as vacas para “tocar o engenho” nos poços situados no alto dos campos e regavam o milho pelo pé (rega de alagamento, pelo rego ao pé do milho); Depois vieram os motores de rega a “petróleo” (temos ali no museu um Wisconsin, de 1950) e só mais tarde, com esses motores, com as bombas de rega ligadas aos tratores ou com motores elétricos começou a rega por “aspersão”. Primeiro com os pequenos bicos rotativos, atarrachados em tubos de polegada, ligados a tubos de plástico de 6 metros que se mudavam pelo meio do milho (que frete!); depois com os bicos maiores, os “canhões” de rega em tripés, ainda pelo meio do milho, pelo meio porque tinha de ficar o campo todo cheio de milho e só se cortava o “caminho” pelo meio antes da silagem (outro frete), para meter esse milho cortado na máquina de silagem à posta (frete e meio);
Aqui no Norte (quase) não há pivôs para regar. Um ex-ministro até pensava que não regávamos o milho, porque não via pivôs. Não sabia o que passávamos e ainda passamos com as regas, agora com menos trabalho por hectare, mas com mais área para regar. Há 30 anos, quando as máquinas de rega, enroladores tipo “bauer” ou “irrifrance” eram muito caras, serralheiros portugueses inventaram os “carrinhos de rega”, com material reciclado de carros da sucata (caixa de velocidades, diferencial, rodas dentadas, um cabo de aço e uma mangueira flexível arrastada.... Ainda se fabricam e andam muitos por aí a regar (tenho 3 parados e dois a funcionar) mas entretanto os enroladores democratizaram-se (também comprei três).
Há 15/20 anos ouvimos falar da rega gota-a-gota no milho; eu tinha a ideia desse sistema ser usado, de forma fixa, nas árvores de fruto, não imaginava no milho. Até organizamos uma visita de Estudo até Vagos para ver a sua utilização, sobretudo nos terrenos plano e arenosos. Há 15 anos aluguei uns terrenos arenosos; Reguei-os no primeiro ano com os “carrinhos”, cansei-me e num dia de calor vi uma parte do milho secar.
No ano seguinte comecei a minha experiência a regar 2 ou três hectares em gota-a-gota, usando algum material de ocasião já cheio de pó (relógio, eletroválvulas, tubo de derivação, filtro…) que comprei a uns colegas que tinham experimentado e correu mal. Penso que a falha deles tinha sido regar um terreno com muito declive e as fitas de rega rebentavam na parte de baixo, com o excesso de pressão. A minha experiência correu razoavelmente. Colocamos a fita linha sim, linha não. No ano seguinte reduzi para um hectare, que continuo a regar com esse sistema; há 2 anos experimentei noutro campo (metade) e correu bem. O ano passado tentei regar todo esse terreno, mas tive problemas porque a fita entupiu por causa da sujidade (terra) suspensa na água de rega; no outro campo cheguei a ter problemas com ratos que mordiam a fita e às vezes com insetos que furavam a fita. Há colegas que reutilizam a fita da gota vários anos. O que eu faço (e a maioria, acho) é recolher no fim da campanha para reciclar e comprar fita nova todos os anos. Custa cerca de 150/200 euros por hectare, a fita, mas poupa-se na eletricidade usada na rega, tanto no consumo como na taxa de potência; Para além dessa poupança, a vantagem é que depois não se tem de mudar a maquina de rega. Outra grande vantagem é poder regar a qualquer hora e não ser afetado pelo vento (muito bom junto a estradas e casas de vizinhos); As desvantagens, como disse, são o custo anual da fita, o custo inicial da mangueira de derivação, a mão de obra para estender, ligar a fita e depois recolher. Não é um sistema perfeito, mas ganhou dimensão e adeptos. É mais uma opção.
Um colega agricultor viu este vídeo e pediu-me opinião e alguns conselhos sobre a gota-a-gota no milho. Aqui está a minha experiência; Quem tiver outras experiências sobre a rega gota-a-gota que possa partilhar, comente, por favor!
#carlosnevesagricultor
“E uma selfie com o Marcelo, não tiraste?” Pois não, não tirei uma “marcelfie”:), porque o covid obriga-nos a manter distâncias, mas tive muito gosto em acompanhar a visita do Presidente da República à Sociedade Agrícola Carreira Gonçalves, em Esposende, no passado 10 de maio. Foi uma oportunidade de mostrar as condições de bem-estar em que as vacas estão alojadas, os modernos equipamentos de ordenha e o armazenamento do leite com toda a segurança alimentar que nos permitem produzir o leite com que brindámos e os queijos que o presidente provou, repetiu e elogiou.
Uma associação ambientalista, a FAPAS, emitiu há dias um comunicado a criticar a instalação de passadiços e baloiços. Algumas dessas críticas até sou capaz de subscrever: que a instalação devia ser alvo de estudo de impacto ambiental (pensei que sempre fosse), que se deviam privilegiar os trilhos e caminhos existentes (mas atenção às pessoas de mobilidade reduzida), que a manutenção e segurança pode ser deficitária (dos baloiços, suponho), que o excesso de visitantes pode perturbar a fauna local e que se corre o risco de ser uma moda passageira e ficarem estas estruturas ao abandono dentro de alguns anos.
- Então esta é que é a tua bimby?
Perguntou-me um fornecedor depois de esperar que eu descarregasse a comida das vacas. Lembrei-me que ainda não mostrei em funcionamento. Aqui podem ver, num vídeo de um minuto, o Hugo a carregar palha, silagem de erva, silagem de milho, mexer para misturar e distribuir:
https://youtube.com/shorts/dHIhfljIMN8?feature=share
Ps - para quem não leu, no ano passado, o link para "a bimby das vacas" está aqui também :
https://carlosnevesagricultor.blogs.sapo.pt/a-bimby-das-vacas-27193
"O dia 1 de junho é desde 2001 o Dia Mundial do Leite, uma iniciativa da FAO, Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação. O leite e seus derivados desempenham um papel fundamental na nutrição e no desenvolvimento humano saudável ao longo da vida, mas especialmente na infância. Alimentos de origem animal, incluindo leite, estão associados a melhor crescimento, desempenho cognitivo e desenvolvimento motor entre as crianças.
O setor de laticínios está comprometido com uma produção ambientalmente responsável e não é um contribuinte importante para as emissões globais de GEE (Gases de efeito de Estufa), pois contribui com menos de 3% dos GEE e este carbono libertado foi antes captado pelas plantas cultivadas pelos agricultores. Além disso, as vacas leiteiras são recicladoras, transformando os caules de milho, trigo, ervas e subprodutos dos biocombustíveis e da alimentação humana em proteína de alta qualidade para consumo humano.
Devido à pandemia, não podemos celebrar em 2021 o dia do leite recebendo crianças nas nossas quintas e vacarias ou organizando workshops sobre o queijo fresco nas escolas, mas continuamos a trabalhar a terra, a cuidar dos animais e disponíveis para comunicar, mesmo que à distância. Neste sentido lançámos um passatempo para envolver as crianças, professores e pais. Desafiámos cada turma ou grupo a fazer um desenho a relacionar o dia do leite com o Dia Mundial da Criança." (comunicado Aprolep / Leite é Vida) Este foi o desenho mais votado. Todos os desenhos estão de parabéns e disponíveis para ver na página Leite é vida
#carlosnevesagricultor