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Atenção: Proibido trabalhar na agricultura - risco de incêndio!!!

por Carlos Neves, em 26.07.20

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A agricultura é a melhor prevenção para os incêndios. Uma agricultura viva à volta das aldeias, com terrenos cultivados ou alvo de pasto de vacas, ovelhas ou cabras (essas, capazes de pastar também a floresta) impede que o fogo chegue às casas.. Mas, atenção, em situações de risco, trabalhos agrícolas ou florestais podem causar incêndios.
Para os dias 27 e 28 de julho foi declarado estado de alerta que proíbe naturalmente queimadas, atividades na floresta e ainda “trabalhos nos espaços florestais e outros espaços rurais com recurso a qualquer tipo de maquinaria, com exceção dos associados à alimentação de animais e a situações de combate a incêndios rurais”. Faz sentido esta proibição “total”? Vejo reações de revolta com esta medida. Quem terá razão?
Vamos por partes: os incêndios podem ter causas naturais (trovoadas secas, já aconteceu este mês), ser ateados por incendiários com interesses económicos ou doentes (pirómanos) e ser causados por descuido. Acontece muitas vezes, mais do que imaginam. O mais comum são as queimadas, mas também aconteceu estes dias num churrasco, num trabalho agrícola e com uma roçadora na limpeza da floresta. Não acreditam?
A mim já aconteceu duas vezes, sem consequências. A primeira vez, há cerca de 20 anos, a velhinha automotriz que cortava o milho começou a deitar fumo devido a um rolamento que aqueceu. Parámos a tempo e não houve incêndio na máquina, nem havia risco estando no meio de um campo de milho silagem (verde). A segunda vez aconteceu-me este ano, ao cortar um campo de erva já bem seca. Tive o cuidado de fazer o trabalho num dia de temperatura amena (estavam pouco mais de 20 graus) e pouco vento. Estava a terminar o campo, já no centro e vi o fogo a começar quando voltei a passar no mesmo sítio poucos minutos depois. A erva seca era pequena, estava cortada e o incêndio teve meio metro quadrado e foi fácil de apagar. Uma pedra no centro da zona ardida foi a causa evidente da ignição, ao passar a gadanheira.
Portanto, é complicado, mas tenham paciência: nestes dias de risco máximo de incêndio, por causa do vento e da baixa humidade, há trabalhos que não se podem fazer na floresta, próximo da floresta ou em qualquer terreno com erva seca. Isto devia ser notícia de abrir o telejornal e ser bem explicado às pessoas, para prevenir, mesmo aquelas que pensam que sabem tudo, que isto dos incêndios é só culpa dos incendiários, porque hoje o risco de incêndio grave é muito maior do que era há 20 ou 50 anos atrás, por causa do clima, da evolução da floresta, dos terrenos abandonados, da população rural envelhecida...
Por outro lado, para além da excepção sobre alimentar os animais (muito bem, uma evolução face ao estado de alerta no início do mês de julho) há uma série de trabalhos, a começar pela rega, que previnem os incêndios, que não se devem parar e não se podem adiar, sob risco de perder as culturas, como tratamentos fitossanitários ou colheitas de frutas ou hortícolas. Portanto, precisamos melhor comunicação sobre isto e distinguir melhor os trabalhos perigosos dos que podemos realizar, sob pena de uma proibição total não ser levada a sério e não haver polícia para controlar tanto agricultor e entretanto ficam à rédea solta potenciais incendiários. Mas, antes de mais, paciência, atenção e muito cuidado. Se não der para fazer mais nada à sombra, aproveitem para descansar. É uma ordem, para nossa segurança, da floresta e das nossas aldeias. Nunca vos aconteceu chegar à conclusão que “mais valia estar quieto”?
#carlosnevesagricultor
#portugalchama

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publicado às 22:29

Milho, rega, água e leite

por Carlos Neves, em 20.07.20

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O milho é uma cultura fantástica capaz de produzir 60 toneladas de matéria verde por hectare em pouco mais de 4 meses de cultivo. Durante esses quatro meses, o milho produz mais oxigénio que a mesma área de floresta e os campos de milho verde são a melhor barreira contra incêndios. 

Para crescer, o milho precisa de calor, água e nutrientes. Calor não costuma faltar no verão, as nossas terras são férteis pelo trabalho de gerações e água... bem, na primavera cai alguma, mas depois a maioria dos terrenos exige rega.

"Ai como eu gosto da rega!" (para os mais novos, #aicomoeugostodarega), é um desabafo que repito muitas vezes, por causa da montagem das regas, dos canos que rebentam, dos acessórios e engates que enferrujam e apodrecem, das bombas que perdem a água, da nortada que não deixa regar por aspersão, do tempo que se rouba ao descanso, à família ou ao cuidado das vacas para ir mudar regas ou das faturas da EDP que não param de aumentar (já agora, só um aparte, se os chineses vendem tudo mais barato, porque vendem a eletricidade tão cara?). A consolação deste trabalho, além de ver o milho regado e a crescer com qualidade (quando a água chega a tempo) é poder observar e fotografar algumas imagens muito boas (passem no meu facebook a ver). E também dá para refletir e tirar algumas lições de vida, como o caso que passo a contar.

Comecei a cultivar um terreno o ano passado. É uma parcela com 1,5 ha, em declive, tendo a parte de baixo terra fresca e a parte de cima terra fértil mas seca. Levei para lá uma maquina de rega de fabrico artesal, uma “geringonça” conhecida por “biclicleta”, por causa da sistema que a faz mover arrastando uma mangueira flexível como as que usam os bombeiros (preferia usar uma máquina melhor, mas com o preço que recebemos pelo leite nos últimos anos…) Essas mangueiras são mais fáceis de arrumar que os tubos pretos mas são mais caras e degradam-se ao fim de uns anos, começando a surgir furos que aumentam cada vez mais. O ano passado coloquei alguns remendos, foi perdendo água mas lá fui regando. Com mais um ano em cima, os furos aumentaram. E eu, pacientemente, levei fita-cola e fios de fardo para reutilizar e lá passei uma boa meia hora a fazer remendos ao longo da mangueira. E outra meia hora noutro dia. O problema é que a gente tapa num lado e abre noutro. E eu pensei no preço do leite que é baixo e é preciso conter as despesas, adiar os investimentos, e lá deixei a rega com a mangueira furada, mais um mês e já acabava… e perdendo metade da água pelo caminho, a correr para a parte de baixo que nem precisava de rega… até ao dia em que vi o milho à sede e percebi que o jato de água do aspersor já não atingia os metros suficientes para regar todo o terreno… e perdi o amor ao dinheiro, fui à cooperativa e comprei uma mangueira nova… 

Em pouco mais de uma hora ficou a mangueira no sítio, foi só trocar os acessórios de engate e bem… a rega ficou completamente diferente. Agora o aspersor atira tão longe que até dá para regar o milho do vizinho (e ele merece, porque me deixa passar pelo terreno dele quando preciso), a água dura muito mais tempo, rego mais depressa toda a parcela, com mais eficiência, pois gasto menos água, menos eletricidade e fica melhor regado o milho. Olhando para isto tudo e juntando com outros números que tive em mãos na mesma altura, fiquei a pensar nos milhões que o consumidor paga pelo leite, pela manteiga, pelos queijos, iogurtes e outros produtos lácteos e no valor que se perde pelo caminho até chegar ao produtor. E nós, produtores, andamos tão ocupados a trabalhar que não tiramos um bocado de tempo para fazer perguntas, para ler relatórios e ver onde estão as fugas de valor… às vezes pode ser um pequeno remendo a resolver a situação, outras vezes pode ser precisa uma mudança geral. Há que tirar tempo, avaliar bem e não ter medo de mudar o que for preciso. //

Este texto é de Agosto de 2017. Lembrei-me dele esta semana quando alguém me contou que teve de comprar uma mangueira nova para a máquina. Permanece atual. Era para escrever outro mas, por causa da rega, ainda não tive tempo 😂

#carlosnevesagricultor 

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publicado às 19:26

As férias dos agricultores

por Carlos Neves, em 08.07.20

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Eram 16h30 e a praia estava ótima. A praia é o local mais aprazível da minha freguesia de Árvore e o por isso mesmo é também o melhor local para as férias em part-time que vamos fazer este ano. Nunca fiz grandes férias, mas tentei sempre tirar uma semana fora e depois aproveitar mais algumas visitas à praia, normalmente de manhã, porque à tarde temos nortada. Hoje foi ao contrário. De manhã esteve nublado e aproveitámos para mudar as várias máquinas de rega. Agora de tarde havia mais trabalho para fazer, mas parar um pouco, ler um livro, caminhar à beira mar, ajudar o Luís a fazer castelos ou escrever um texto que me dá gosto também é importante. Por isso vim. Vim também por causa de um texto da página @Of kids and cows (um blog sobre criar miúdos numa moderna quinta de produção de leite nos Estados Unidos), partilhado há dias por outra Blogger, a Dairy Carrie: «Todos os anos, nas férias, ouço produtores de leite com a mesma conversa, umas vezes em jeito de desabafo, outras de orgulho -"tenho de ordenhar as minhas vacas duas vezes por dia, há vários anos que não tenho férias nem vou a uma festa da família" . E achamos que isso nos torna melhores? Eu também ordenho minhas próprias vacas duas vezes por dia. E deixe-me dizer, não é o ideal. Estou cansada. Eu quero (preciso) de umas férias. Seria melhor agricultora / mãe / pessoa se tivesse mais tempo para mim.

Não há glória em declarar que você não tem um tempo valioso para amigos e entes queridos porque está trabalhar. Não esperamos isso de outras profissões, por que diabos esperamos isso de nós mesmos?!? Dê um tempo! Tire algumas horas para fazer um piquenique, jogar bola com seus filhos, jantar com a sua mãe… Vá. Você merece isso.»
E vocês, que pensam disto? Vão ser diferentes as férias de 2020? Agricultores, conseguem conciliar o trabalho agrícola com as férias?
#carlosnevesagricultor

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publicado às 23:03

Agriculturas de várias formas e tamanhos

por Carlos Neves, em 02.07.20

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Eram 5 horas de uma tarde nos primeiros dias de maio, eu tive de parar a sementeira do milho para abastecer o semeador com semente e adubo, que deixara à sombra de umas árvores junto à ribeira da Granja. Aproveitei a sombra e a paragem para merendar durante 10 minutos e, de caminho, espreitar as novidades no Facebook, para variar das notícias sobre o Covid19 que passavam nos noticiários de todas as rádios. A primeira publicação que me apareceu era do Farmer Tim , agricultor canadiano que, a 7000 km de distância, por esses dias, fazia o mesmo que eu, semeava milho. 

Tim May é a terceira geração de uma família de produtores de leite em Ontário, no Canadá. “Farmer Tim” (agricultor Tim) foi a alcunha que lhe deram as crianças que visitavam a sua vacaria para conhecer a agricultura que ele agora mostra no seu blog diariamente. No dia anterior, um colega agricultor gozara com uma foto do seu velho semeador de milho de 4 linhas (do tamanho do meu 😊). Ele respondeu então que sim, é pequeno, já não se veem muitos daqueles semeadores, mas aquele serve os propósitos da sua quinta, porque ele não tem centenas de hectares para semear, consegue semear toda a terra em 1 ou 2 dias (como eu 😊). Já está pago há muito tempo e ainda o partilha com outro vizinho (como o meu, comprado em sociedade com outro agricultor há 20 anos, em troca de outro mais pequeno, também de sociedade); Explicava ainda que a máquina era suficientemente pequena para passar nas entradas pequenas e semear os campos pequenos e no final da campanha pode esquecê-lo num canto do armazém e guardar até à próxima campanha. Não é bem “esquecer”, precisa de uma boa lavagem e lubrificação. Tim gostaria (como eu) de ter um semeador maior, com GPS e outras tecnologias que já semeiam pelos nossos campos. Lá, como cá, também há a opção de contratar um prestador de serviços. É uma opção possível, tem um certo custo e às vezes temos de esperar pela nossa vez. Mas isso são opções que cada agricultor deve tomar na sua liberdade de empresário de um pais democrático.
Contudo, a mensagem principal, que quero sublinhar aqui, foi a sua frase final: “Há espaço no mundo para agricultores de todas as formas e tamanhos. Vai ser preciso uma equipa de pequenos e grandes agricultores para alimentar o mundo”.
O tamanho das coisas e das empresas é sempre relativo. Para os padrões do Canadá ou dos Estados Unidos a quinta do Tim pode ser pequena. Em muitas regiões do mundo seria uma grande empresa agrícola. Com um hectare de montado no Alentejo morremos à fome, com um hectare de estufas na Póvoa ou no Oeste temos trabalho e rendimento para uma família…
Ter um vaso com ervas aromáticas na varanda ou uma galinha numa gaiola não basta para fazer de alguém agricultor, mas a partir de quantos metros de quintal, quantos coelhos ou quantas galinhas podemos considerar alguém “agricultor”? Pode parecer uma pergunta descabida, mas há uns anos atrás fui chamado à junta de freguesia para ajudar a indicar os agricultores existentes cá na terra, para serem depois visitados pelo recenseamento agrícola, e havia uma tabela, de um número mínimo de galinhas ou coelhos ou do tamanho do quintal, para justificar o inquérito…
O importante é não termos vergonha de sermos “pequenos” na área de cultivo ou antigos nas máquinas e tratores, nem vaidade de sermos grandes, mas cada um aproveitar as suas condições para cultivar a terra e criar os animais da melhor forma possível para darmos o nosso contributo nessa equipa que alimenta o mundo. Boas sementeiras, boas regas, boas colheitas!
(Artigo para a revista Mundo Rural de junho 2020)
#carlosnevesagricultor

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publicado às 21:18


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